PROSTITUIÇÃO POR UM REAL (7/9/2009)
Meninas só valem uma pedra
Galeria
Garotas fazem ponto na Avenida Juscelino Kubitschek, no bairro Castelão, durante os dias e as noites. A maioria vende o corpo bem barato para comprar pedras de crack (Foto: Alex Costa)
Drama comum: costureira faz programas desde os 17 anos para sustentar o vício, já perdeu as contas de quantos por dia
Apenas R$ 1,00. Por uma simples moeda, menores de idade estão vendendo o corpo em alguns locais de Fortaleza. O valor irrisório, por si só, seria suficiente para estarrecer, mas o motivo dessa prostituição "a preço de banana" torna o quadro ainda mais degradante: meninos e meninas usam esse dinheiro para comprar pedras de crack. O vício incontrolável anestesia o corpo para aguentar inúmeros programas ao longo da noite ou do dia. Ao mesmo tempo, condena o futuro de adolescentes e jovens que deveria ser construído na escola.
A informação de que menores de idade se prostituem por até R$ 1,00 é de uma das coordenadoras pedagógicas da Associação Barraca da Amizade, Iara Lima. Os educadores da entidade participam de abordagens de rua do Projeto Ponte de Encontro, da Secretaria de Direitos Humanos de Fortaleza (SDH).
Em três bairros diferentes de Fortaleza, a reportagem do Diário do Nordeste encontrou garotas que se prostituem para comprar crack. Em um deles, na zona sul da Cidade, Samantha (nome fictício*), de 15 anos, mostra os seios assim que vê o carro da equipe de reportagem. Em plena tarde de um dia de semana, ela aparenta estar completamente drogada e pede esmola. Apesar do corpo extremamente magro indicar o uso da "pedra", a garota nega querer o dinheiro para se drogar. A colega Fabíola (*), 25, porém, confirma: "Todas aqui se prostituem para comprar crack".
A fissura pela droga é tão grande que as próprias garotas se oferecem para os clientes. Em um bairro vizinho, Ronald (*), porteiro, 36, conta que uma garota tentou seduzi-lo por R$ 2,00. O valor incluiria "tudo", ou seja, todas as modalidades de sexo possíveis. "Ela aparentava ter de 14 a 16 anos, no máximo", conta, afirmando que a adolescente parecia estar "lombrada"(drogada).
Inicialmente, a garota pediu-lhe carona. No meio do caminho, perguntou se ele queria fazer um programa com ela por R$ 5,00. Diante da negativa, o valor foi baixando até chegar aos R$ 2,00. Sem aceitar o convite, o porteiro a deixou próximo de onde ela disse morar, mas acredita que a moça foi direto para uma "bocada" comprar mais "pedras".
Trabalhadores do mesmo bairro contaram informalmente à reportagem que cerca de oito garotas - maiores e menores de idade - passam dia e noite fazendo programa. "Elas fazem toda hora. Saem do programa e vão fumar pedra", afirmam.
O local para a prática do sexo depende da condição do cliente. Pode ser no motel, no carro ou mesmo em terrenos escuros e abandonados, sem a menor condição de higiene. Algumas chegam a roubar os clientes, segundo afirmam os trabalhadores.
Além dos perigos inerentes à prostituição, as garotas têm de conviver com ameaças dos traficantes. Rosa(*), 19, diz que pode conseguir crack para usar no programa e aceita, inclusive, que o pagamento seja feito com duas "pedras". Ao desconfiar estar falando com um policial, clama, aflita: "Não me bota em enrascada não, porque se o traficante descobrir que eu tô pegando droga pra policial, ele não vai me bater não, ele vai me matar".
Camila (*), 20, diz que se prostitui desde os 15 anos. Consegue a "pedra" por R$ 5,00 e o mesclado, por R$ 7,00. Ao ser indagada sobre para que usa o dinheiro obtido com os programas, responde: "Pra tudo. Pra beber, pra cheirar, pra curtir o mesclado". Em outro bairro, agora na zona norte, Marcelle (*), de 19 anos, diz que consegue tanto o mesclado quanto a pedra "pura" por R$ 5,00.
Engana-se quem pensa que a prostituição associada ao crack está restrita às classes sociais mais baixas. A cabeleireira Lina (*), 40, diz já ter presenciado "uma menina linda", aparentemente de classe média, aceitar transar com um traficante por não ter mais dinheiro.
Pesquisa
Em dezembro de 2008, a Coordenadoria da Criança e do Adolescente (Funci) lançou o livro "Os Sete Sentimentos Capitais", pesquisa com 328 meninos e meninas envolvidos em redes de exploração sexual em Fortaleza. Todos tinham até 18 anos, sendo 224 mulheres e 124 homens. A droga foi o quarta motivo mais citado para a prostituição (3,3%), depois de dinheiro (58%), diversão (12%) e aventura (10%), e empatando com a resposta "prazer". As abordagens ocorreram na Barra do Ceará, Praia de Iracema, Beira Mar, Praia do Futuro, Centro, Castelão, Av. Expedicionários, Av. Osório de Paiva, BR-116 e terminais de ônibus.
ARREPENDIMENTO
Desde os 17 anos: "Não consigo parar"
A costureira Fabíola (nome fictício), 25, vira o rosto, baixa a cabeça, coloca a mão por baixo da blusa e puxa a roupa, como se quisesse manter o controle de alguma coisa. Não consegue. Basta ser perguntada sobre porquê está "nessa vida" que ela começa a chorar. Para manter o vício pelo crack, ela se prostitui desde os 17 anos.
"Não consigo parar", assume. As lágrimas descem com mais intensidade quando fala sobre os filhos. "Tenho dois. Minha filha foi tomada pelo meu marido, porque ele descobriu...", diz, referindo-se ao crack. "Meu filho, levei para morar com a minha mãe", continua. Vê os filhos poucas vezes. Passa o dia fazendo programas na zona norte da Cidade. Por até R$ 10,00. Dia e noite.
- Quantos programas você faz por dia?
- "Eu sei lá".
- Perde a conta?
(Sinaliza afirmativamente).
A costureira diz que provou o crack por conta da namorado, que a ofereceu um mesclado. Em seguida, passou para a "pedra" e, daí, perdeu o controle. "Entrei nessa para não roubar. Nunca roubei", garante. Enquanto algumas garotas passam a noite alternando "pauladas" na droga e programas, Fabíola diz que prefere juntar o dinheiro até o montante que deseja. Daí, compra várias pedras de crack para fumar. E, talvez, derramar mais lágrimas.
RISCO MAIOR
Droga passou a ser fonte de DSTs
Quando surgiu em São Paulo, o crack era uma droga predominantemente usada por homens. Nos anos 90, as mulheres passaram a usá-la e encontraram, na prostituição, a saída para manter o vício. Assim, a droga tornou-se fonte de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST´s).
Segundo a pesquisadora do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid), Solange Nappo, isso acontece porque, geralmente, as mulheres que se prostituem para comprar crack não exigem que o cliente use preservativo.
Esse quadro também preocupa em Fortaleza. Entre os 36 adolescentes (de 13 a 17 anos) usuários de crack atendidos no Projeto Ponte de Encontro em julho passado, houve 21 casos de DST´s. Os dados são da SDH.
Segundo a coordenadora do projeto, Patrícia Queiroz, quando há diagnóstico de adolescentes com DST´s ou outras doenças, eles são encaminhados para tratamento nos postos de saúde. Além dessa ação, o projeto faz abordagens de rua com os menores em situação de exploração sexual de forma a tentar "reconstruir a visão de rua" deles, trabalhando a autoestima.
Conforme Iara Lima, da Associação Barraca da Amizade, que também participa das abordagens, o primeiro passo é identificar a história de vida de cada um e, em seguida, convencê-los a sair da rua, que pode ser para a família ou para um abrigo.
Outras doenças
Além das DSTs, o uso do crack provoca outras doenças. Nos dados de julho do Ponte de Encontro, há 48 atendimentos por problemas respiratórios, 41 por doenças de pele, 25 por perda de peso e 14 por tuberculose. Todas essas doenças, além da hepatite, são características dos usuários de crack.
PESQUISA
Mulher tem mais dificuldade de parar
A professora do Departamento de Psicobiologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Solange Nappo, foi a pesquisadora principal do livro "Comportamento de Risco de Mulheres Usuárias de Crack em Relação às DST/Aids", lançado pelo Cebrid em 2004. Segundo ela, é mais difícil para as mulheres largar o crack.
Na pesquisa feita pela professora em São Paulo, de 80 mulheres entrevistadas, apenas duas buscaram tratamento. "É mais difícil porque ela é mulher, porque transgrediu, está usando a pior droga da lista e se prostitui. Ela tem poucas chances de se inserir na sociedade porque tem todos os estigmas que uma mulher pode ter. Por isso, ela não busca tratamento", explica.
No aspecto hormonal, Solange Nappo explica que a mulher tem propensão a ser mais compulsiva que o homem se usar o crack na fase do ciclo menstrual em que há maior quantidade de estrógenos, pois o hormônio estimula o sistema nervoso central, assim como a droga.
Quanto à contaminação por DSTs, a pesquisadora explica que a maioria das mulheres que se prostitui pelo crack não usa preservativo, ao contrário da profissional do sexo. O principal motivo para isso, além da desinformação que ainda existe sobre os riscos do sexo, está no fato de que a compulsão é tão grande, que proteger o corpo fica em segundo plano.
Pelo sexo inseguro e sem condições adequadas de higiene depois dos programas, a "prostituta do crack" pode acumular sêmen contaminado e transmitir doenças para outros parceiros. Conforme Nappo, a maioria das mulheres entra no crack porque o parceiro é usuário e é iniciada na prostituição pelo traficante, que a considera melhor pagadora que o homem.
REPÓRTER ÍCARO JOHATAN no Diario do Nordeste de 07
Depois do italiano, a volta à normalidade
Por Ubaldo, o Paranóico
Caro Nassif,
Veja a que nível chega a histeria hipócrita de nossa sociedade. Enquanto o tal italiano vai preso (acusado de estupro!) pelo fato de dar um “selinho” na filha, à luz das Praias do Ceará, essas outras meninas ficaram restritas a uma página de jornal, sem a mínima repercussão, e sem nehum “moralista” para mandar prender algum político…
http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=668827
O link está com data de 11.09. mas a data certa é 7.09 (dia da Independência!).
Observe, no final do artigo (logo abaixo do nome do jornalista, encimando o quadro “comente essa matéria), há um anúncio (à esquerda do quadro) com os seguintes dizeres: “Ache a mulher ideal – Milhares de perfil (sic) de mulheres para todas as idades”. É de doer, não é não?
Comentário
Como é anúncio Google, é possível que já não esteja quando acessarem a página.
Fonte do comentário do Ubaldo http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/2009/09/11/depois-do-italiano-a-volta-a-normalidade/
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