As mulheres, em 2008, já tinham mais de um ano de estudo em comparação com os homens: 9,2 anos
A UNIVERSIDADE de São Paulo decidiu selecionar, neste ano, estudantes de escolas públicas do ensino médio para passar um ano dentro dos seus laboratórios, onde conviveriam com pesquisadores e aprenderiam a pensar como cientistas. Dos escolhidos para ganhar essa bolsa de iniciação científica, 80% são meninas.
Traduzindo o emaranhado de estatísticas sociais divulgadas pelo IBGE na sexta-feira passada, dá para ver que essas meninas que entraram nos laboratórios não são um fato isolado -e serve para comemorar o Dia da Criança, celebrado amanhã.
O que chama a atenção é menos as informações sobre as crianças, mas sim o que vem ocorrendo com as mulheres -ou seja, com as mães ou futuras mães.
Um dos fatos novos da paisagem social brasileira é a mudança da mulher. A mulher superou a escolaridade dos homens, não para de crescer sua posição no mercado de trabalho e consegue planejar melhor o número de filhos. O que, em síntese, significa dizer que as crianças estão menos desprotegidas.
A situação geral é ruim, como mostraram mais uma vez as estatísticas. De acordo com o IBGE, cerca de metade dos brasileiros até 17 anos viviam, no ano passado, em famílias pobres -menos de meio salário mínimo per capita. No NE, sobe para 67%. É ruim, mas seria ainda pior sem o programa Bolsa Família.
Até se verificaram avanços na matrícula em creches. Mas não passaram de 18% do total de criança. Ainda, portanto, muito pouco. Mais expressivos são os avanços da mulher, o que sugere, para o futuro, uma infância menos vulnerável.
As mulheres têm menos filhos, segundo os dados do IBGE, reafirmando uma tendência de muitos anos. Vejam os números absolutos -e aí a estatística impressiona.
Em 1998, foram cerca de 700 mil partos em adolescentes entre 10 e 19 anos; agora, são 485 mil.
Refletindo o que ocorre nos grandes centros, o movimento na cidade de São Paulo é ainda mais intenso, segundo informações de autoridades de saúde paulistas. Em 2000, registraram-se 34.608 casos de gravidez precoce; em 2007, 24.296, ou seja, uma queda de 30%. Por causa de uma série de programas como a distribuição de anticoncepcionais (inclusive pílula do dia seguinte) no metrô e estações de trem, a tendência é se acelerar.
O melhor preservativo, porém, está mesmo na cabeça. As mulheres, em 2008, já tinham mais de um ano de estudo em comparação com os homens: 9,2 anos. Em cada cem pessoas com ensino superior, 57 são mulheres -é só uma questão de tempo para ganharem mais do que os homens.
Em 2008, 47% das mulheres estavam empregadas; em 1998, 42%.
Há uma série de consequências previsíveis no fato de a mulher ter mais emprego e escolaridade. O debate sobre a qualidade de ensino só tende a crescer. Não será por muito mais tempo que provocará pouco barulho os exames mostrando que os alunos saem das escolas públicas sem ler nem escrever direito.
Tende a crescer -e muito- a pressão por mais creches. Até porque é consenso entre estudiosos sobre a importância de estimular as crianças nessa idade. Certamente haverá mais pressão para as várias ações, espalhadas em saúde, lazer, esporte, cultura, que signifiquem o desenvolvimento de habilidades.
Educação em tempo integral irá, em breve, para o topo da agenda.
Não precisará ser todo o tempo na escola, mas em alguma atividade educativa. Uma das notícias mais interessantes sobre a infância brasileira é a expansão da jornada escolar, com uso complementar dos espaços da cidade. Para a mulher que trabalha, dá mais segurança saber que o filho está menos na rua ou trancado em casa vendo televisão.
Não é à toa que os prefeitos que implantaram educação em tempo integral tiveram reconhecimento nas urnas nas eleições passadas.
Uma das mais férteis decisões de Lula (e quase desconhecida) foi criar um fundo para dar mais dinheiro aos prefeitos e governadores que ampliarem a jornada escolar.
É uma agenda, vamos reconhecer, mais sofisticada do que as dos homens. Digo isso porque, nas reuniões de pais e mestres das escolas públicas, quem vai mesmo (isso quando vai) é a mãe.
PS - Pelos meus critérios, foi muito mais importante para a paisagem do Rio ter implantado, em suas regiões mais pobres e violentas, um programa de bairros educativos, com ampliação da jornada escolar, do que as Olimpíadas. Esperem para ver.
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